
Fala-se muito do avanço da tecnologia. E pouco do avanço da preguiça impulsionado pelo avanço tecnológico. Aliás, desde tempos imemoriais, a tecnologia sempre esteve diretamente ligada à preguiça de fazer trabalhos braçais, cerebrais ou “pernais” e outros “ais”.
Nossos antepassados distantes, os homens das cavernas, logo depois de aprenderem a andar eram obrigados a aprender a… correr! Adultos e crianças tinham que ter o físico em dia para não virar refeição dos tigres-dentes-de-sabre. Aí, inventaram a roda e pimba: o vírus da preguiça foi introjetado na alma humana. Hoje cá estamos, a imensa maioria de seres no planeta, levando a vida sentados em poltronas, automóveis, escritórios... Agradecendo todos os dias ao inventor do controle remoto, da batata frita no saquinho e do ar-condicionado.
Não ria, a situação é delicada. Dia desses fui até uma concessionária de automóveis para tentar realizar o sonho de encontrar um carro que oferecesse mais conforto para eu enfrentar o terrível trânsito da cidade de São Paulo. Rezava para o vendedor aparecer com um modelo de veículo que fosse uma réplica do meu escritório ou, pensando melhor, da minha sala de estar, com sofá, mesinha de centro, acesso à internet, TV, videogame e frigobar. Ele não tinha esse modelo, mas apareceu com uma novidade mais bizarra. Em pleno test drive, o rapaz da concessionária me apresentou ao “detector de chuva”. Sim, este é o nome do acessório de luxo. Ao sinal do mínimo chuvisco, uma célula detecta a presença de vapor d’água na atmosfera e liga o limpador do para-brisas! Fiquei estarrecido e disparei a pergunta inevitável: mas… pra quê?!?
Depois de anos de evolução, o ser humano precisa de um acessório para poupar o seu cérebro de pensar – nossa, vai chover… – e apertar um botãozinho no painel do carro?!? O vendedor riu, constrangido com a minha pergunta, mas não totalmente de acordo com a minha indignação. Não tenho dúvidas de que, nesse instante em que você lê essas linhas, milhares de pessoas estão inventando coisas novas para a gente não precisar se movimentar. Pior, para a gente não precisar nem pensar! Veja a tragédia que se abateu sobre os motoristas de táxi depois da invenção do GPS. Tornou-se impossível transitar pela cidade sem que o motorista seja ludibriado pela fé no aparelho.
A dificuldade de locomoção pelas grandes cidades sempre existiu. Antes, o motorista consultava o guia das ruas e os próprios colegas para aprender os novos trajetos. Agora, com preguiça de pensar, deixa o GPS pensar por ele. Só que o GPS, assim como o motorista, foi fabricado por humanos e, portanto, também erra! Juntos, GPS e motorista, erram cada vez mais. E fingem que nenhum dos dois tem nada a ver com isso!
Espero que você tenha seguido o meu raciocínio e comece a observar à sua volta. Especialmente o comportamento dos seus filhos que já nasceram nesse mundo de facilidades e confortos tecnológicos. É importante que nós, preguiçosos ancestrais, os pais dos filhos da geração digital, reconheçamos o fato inquestionável do avanço tecnológico da preguiça. E lutemos para não virar usuários de “detectores de chuva”. Antes que seja tarde, pessoal, com todo respeito, eu os convoco para uma missão importante: vamos mexer a bunda!
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