O verdadeiro meio a meio


  Raoni Maddalena
Na casa da secretária Luciana Trafani, ela e André, seu marido, dividem todos os cuidados do filho Arthur, 1 ano e 9 meses
Quando se fala em dar conta de todos os afazeres domésticos, o discurso é sempre o mesmo: antes, eles eram responsabilidade das mulheres, que ficavam em casa. Agora, os tempos são outros, e, assim como elas se adaptaram ao mercado de trabalho, os homens também precisam fazer o caminho inverso. Mas e na prática, a teoria está funcionando?
Quando perguntamos no Facebook da CRESCER se as pessoas estavam felizes com a divisão de tarefas em casa, só as mulheres responderam – e a maioria disse que não. Na casa delas, ficou dividido assim: “Eles bagunçam e eu arrumo”. Algumas até comentaram que os maridos e filhos tentam ajudar, mas é pior ainda, pois fazem tudo errado.
Realmente, não faltam motivos para elas se sentirem sobrecarregadas. “É muito mais fácil para um chefe compreender que a mãe saia do trabalho para levar um filho doente ao médico. Não se mudam os hábitos, costumes, moral e ética de uma sociedade tão rápido”, explica a terapeuta de casais Teresa Bonumá, que há mais de 30 anos convive com as muitas nuances do convívio familiar.
Mas a situação é menos desanimadora do que parece. E temos uma justificativa científica para afirmar isso: a pesquisadora britânica Laura King revisou estudos e chegou a uma teoria que a figura do pai moderno, que cuida e participa da vida dos filhos, existe há bem mais tempo do que se imagina. Ela defende que isso começou por volta dos anos 1950, após a Segunda Guerra Mundial. Agora, uma coisa é verdade: eles realmente demoraram para sujar as mãos com fraldas. Em 1980, 43% dos pais britânicos nunca haviam trocado seus filhos. Esse número caiu para 3% no ano 2000. E Laura cita um dado de 2010 que aponta que, para 65% das mulheres, os pais são de enorme importância no cuidado com as crianças.
Para que não só o número de trocadores de fraldas, mas de pais e mães parceiros e satisfeitos com seus acordos, fique cada vez maior, conversamos com especialistas e casais bem-resolvidos e selecionamos as dicas deles para tornar a divisão mais balanceada na sua família. Leia a seguir:
1. Mais braços
Livrem-se de algumas tarefas sempre que puderem. Considerem pagar por serviços que vocês não dão conta ou que são um aborrecimento e podem ser feitos por outras pessoas. Desde uma faxineira para arrumar a casa, alguém para passar a roupa (ou mandar lavar fora) até comprar a comida pronta. A secretária Luciana Trafani Gomes e seu marido, o ator André Mello, pais de Arthur, 1 ano e 9 meses, têm uma rotina diferente da maioria dos casais, pois é ele que tem os horários flexíveis e fica mais tempo em casa durante a semana. “O André até faz mais coisas do que eu. Às vezes me sinto mal por isso, pois cresci vendo minha mãe fazer tudo para o meu pai”, diz. Mas ela logo repensa e vê que eles estão bem resolvidos dessa forma. Mesmo assim, quando voltou a trabalhar, há quatro meses, era ela que cuidava da comida do filho quando chegava em casa, às 20 horas. “Entre ficar com ele um pouco e depois ir para a cozinha preparar as refeições do dia seguinte, eu acabava indo dormir à 1 hora da manhã, exausta. Fui ficando irritada com o André e o Arthur. Então, decidi comprar papinha caseira congelada, que resolveu nossa vida.”
2. Keep Calm and... pare com o “mimimi”
Reclamar que só você faz tudo em casa e que detesta o serviço doméstico não adianta. E vamos explicar o motivo com uma leve viagem no tempo. Estamos nos anos 1960, época do seriado norte-americano Mad Men. Os maridos, engravatados, de chapéu e sobretudo, pegam suas pastas e saem para um glamuroso dia de trabalho, cheio de risadas e almoços em endereços chiques. Em casa, as esposas estão extenuadas às voltas com mil tarefas, como faxinar, atender o filho que chora, lavar a roupa, deixar a comida pronta. De qual lado você gostaria de estar?
Com uma descrição como essa, a resposta é evidente. “Claro que, no passado, as mulheres achavam que a vida dos homens era muito mais divertida – e elas não paravam de reclamar sobre quanto suas rotinas eram ruins. A verdade é que erramos muito no marketing! E vamos combinar que nem o trabalho fora é tão cheio de glamour nem todas as tarefas domésticas são tão chatas quanto dizem”, comenta a psicóloga Lídia Aratangy, autora de livros como Novos Desafios da Convivência: Desatando os Nós da Trama Familiar (Ed. Rideel). Então, se quiser ter mais chances na hora de negociar a divisão, experimente parar de falar quanto lavar a louça é chato. A mudança não vai acontecer de uma hora para outra, mas já é um começo.
3. Nova família, novas regras
“Quando vamos viver juntos, unimos duas pessoas que cresceram em famílias diferentes – e é preciso compreender que isso exige adaptações. Pode ser que o pai do parceiro não fizesse nada em casa e foi esse o modelo que ele teve”, explica o psicoterapeuta Luiz Cushnir, autor de, entre outros títulos, Como Mulheres Poderosas se Tornam Mulheres Conquistadoras (Ed. Planeta). Sim, é preciso respeitar as experiências de cada um, mas elas não devem servir de desculpa para não se fazer nada. Aconteceu com a designer Luciana Gianesi Diegues, que já morava sozinha quando se casou com o economista Guilherme, que morava com os pais e tinha sempre alguém para arrumar as coisas por ele. “Expliquei que, se ele tirasse tênis e deixasse na sala, o par não iria magicamente para o lugar. Ficaria lá para sempre”, conta. Ela diz que o processo foi bem natural e, hoje, com Bruna, 10 meses, eles dividem tudo: desde dar banho na menina até levar a cachorra Zara para passear e lavar a louça das refeições.
4. Com palavras e paciência
Para equilibrar a balança da divisão de tarefas na sua casa, a melhor saída é conversar. Quando a nutricionista Camila Andrade e o ortopedista Paulo Miziara tiveram a primeira filha, Laura, hoje com 4 anos, ele ainda estava fazendo residência médica e não ajudava em praticamente nada. “Entendo que sobrava pouco tempo para ele, mas também acho que faltava sensibilidade para perceber que eu precisava de ajuda”, diz Camila. Ela conversou uma, duas, muitas vezes, para expor suas insatisfações e necessidades. Hoje, com o nascimento da segunda filha, Sofia, de 4 meses, ela diz que se surpreendeu com a mudança. “Ele cuida da mais velha, pois sabe que preciso me dedicar à bebê. Dá banho, jantar, brinca, põe para dormir. Valeu a pena toda a conversa, pois nós dois amadurecemos e achamos um jeito melhor.”
5. Segure a onda quando os filhos chegarem
Não tem jeito: com a chegada dos filhos, a rotina da casa costuma dar uma desestabilizada, mesmo se vocês tiverem um esquema que costumava funcionar superbem. Além de mais tarefas e de, no início, o bebê depender muito da mãe, como na amamentação, vários tratos que antes estavam resolvidos e estabelecidos para vocês talvez precisem mudar. “Quando são só os dois, eles têm liberdade de decidir se vão arrumar a cama todo dia ou não, se vão lavar a louça ou não, se vai ter comida em casa ou se vão sair para comer fora todos os dias... Depois isso não é mais possível, pois um filho precisa dos pais como modelo de educação”, diz a terapeuta Teresa Bonumá. Então, se a coisa apertar, vale reorganizar o dia a dia até entrar em equilíbrio de novo. Quando Julia, 4 anos, nasceu, era praticamente só a mãe, a bancária Raquel Debiazzi Mainardes, que cuidava dela. “Embora a gente sempre tenha se dividido bem em casa, acabei assumindo tudo que era da Julia e, quando engravidei da Fernanda, isso pesou.” A filha caçula dela e de Marcos, também bancário, está hoje com 2 anos. Na reorganização, o pai ficou responsável pela maior parte dos cuidados com a mais velha e eles se dividem no esquema de revezamento: em um fim de semana um fica no parque brincando enquanto o outro vai às compras. Está dando bem certo.
6. Questão de habilidade
Na hora de dividir, tente ver o que cada um prefere fazer. Se você gosta de cozinhar, mas odeia passar roupa e ele não se incomoda com essa tarefa, vocês têm um ponto a menos para entrar em conflito. É assim na casa dos zootecnólogos Camila e Marcos Tse, pais de Lucas, 2 anos, e grávidos de 32 semanas de uma menina. “Ele não gosta de fazer as tarefas da escola, pois envolvem muito artesanato e habilidades manuais. Eu já curto bastante. Mas nem sei que dia vencem as contas da casa, porque confesso que é ele que cuida de tudo.”
7. O jeito certo
De um lado, as mulheres reclamam que os homens não fazem o serviço direito. Do outro, os homens desistem de fazer a parte deles – afinal, nunca vai estar bom. “Muitas mulheres querem um ajudante qualificado que execute as tarefas que ela quer, na hora que quer”, diz Lídia Arantangy. Para conciliar esse problema, os dois lados têm que ceder. As mães, entendendo que o parceiro fará as coisas de um modo diferente, e os pais, encaixando na sua rotina as tarefas de casa e percebendo que eles não “ajudam” as esposas. Quem ajuda supõe que está fazendo um favor e não é o caso. As responsabilidades são dos dois e algumas coisas precisam ser feitas com horário. Afinal, criança precisa de rotina tanto quanto um bebê.
8. Brincadeira de criança
Conte com seus filhos para as tarefas do lar. Ou você quer que os parceiros deles fiquem reclamando que não fazem nada em casa quando crescerem? Vá estabelecendo responsabilidades conforme a idade, mas nunca o sexo. Menino e menina podem guardar os brinquedos e levar a roupa suja para a lavanderia já com 2 ou 3 anos. Aos 4, podem ajudar a tirar o pó da sala, dar comida para bichos de estimação e colocar os talheres na mesa. A partir dos 6, já são responsáveis por arrumar a cama e colocar toda a mesa.
  Raoni Maddalena
Enquanto André troca a fralda de Arthur, Luciana lê para o pequeno

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